domingo, 25 de abril de 2010


VÍDEOS DE EUSÉBIO ALMEIDA EM EXIBIÇÃO NA CINEMATECA PORTUGUESA, E NO CENTRO CULTURAL DE BELÉM/MUSEU DA COLECÇÃO BERARDO.

Os vídeos "Emoção Voluptuosa", e "Moeda" de Eusébio Almeida serão exibidos na Cinemateca Portuguesa (entre os dias 26 e 30 de Abril de 2010), e no Centro Cultural de Belém/Museu da Colecção Berardo (dia 30 de Abril), no âmbito do  Ciclo de Cinema, e do Colóquio Internacional: "Imagem e Pensamento" em torno da vida e obra de Klossowski.
Para consultar o Programa: http://www.cecl.com.pt/actividades/actividades-em-curso/124-ciclo-imagem-e-pensamento-ii-pierre-klossowski-e-os-poderes-da-imagem

 


ARTE, FILOSOFIA E CHOCOLATES!

CHOCOLATES, ARTE E FILOSOFIA!


(Notas sobre a teoria do baloiço, e os malabaristas da cultura ocidental).


«Active Evil is better than passive Good».
                                   (William Blake)


Os livros de um filósofo desconhecido colados na parede do quarto. Os quadros desenhados na moldura rugosa do chão. Os dedos apoiados na face negra de uma escultura grega quase nua. As planícies a entrar pela janela do umbigo (essa fonte inesgotável de prazer). E tudo são pretextos para continuar a pensar na gramática do plano demasiado inclinado das palavras. De resto, as palavras só querem provocar a voz do tal filósofo desconhecido, que parece estar a desaparecer juntamente com o brilho dos sapatos. A verdade é que os sapatos do filósofo ainda não aprenderam a andar. Resta-lhes, por isso, começar a pensar.

Aliás, pensar é como respirar o ar puro da montanha prestes a ruir. Pensar é como dar um mergulho nos limites da geometria quase cega do oceano pacífico, onde te imagino vestida de salmão. Pensar é como atravessar o deserto da cultura ocidental a pedalar em cima de uma bicicleta sem motor. É como idealizar o mundo virado de pernas para o ar. Pensar é como saborear uma barra de chocolate. Pensar é parar de comer. É continuar a correr. É resistir à sede, à fome, ao frio, ao desespero e ao legítimo desejo de não querer continuar a viver. É matar a fome com rodelas de limão. É subir sem cair para voltar a descer. Não, não sou filósofo, nem gostaria de o ser. Os filósofos matam as ideias antes delas ganharem vida própria. Também não sou pugilista. Nem poeta. Nem cantor. Talvez seja apenas um simples acrobata distraído em cima de uma placa giratória prestes a partir.

É a partir do chão que recomeço a desenhar a dança maliciosa do duplo retrato do mundo onde existe o plano inclinado da teoria do baloiço. A teoria do baloiço é aquela que nos permite escorregar em cima dos sapatos brilhantes do filósofo desconhecido. Os sapatos a cair. A cair do ar. O ar com que respiramos o sabor da terra. A terra a voar por cima das nossas próprias cabeças (onde tudo parece estar demasiado inclinado para o acidente). Tal como um malabarista a sentir o desespero da próxima queda. Tal como Godot à espera de qualquer coisa, de que um dia acabará, finalmente, por se fartar de esperar.

É ainda da teoria do baloiço que estamos a falar. Ou da teoria do malabarista que sobe e que desce sem parar. Subir ou descer, neste caso, tanto faz, desde que se consiga encontrar alguma água na geometria, quase plana, do deserto da filosofia (onde não deveriam existir territórios proibidos). Não, não sou filósofo, nem gostaria de o ser. Os filósofos são uma espécie de vendedores ambulantes à beira do desespero. Desesperam, porque o mundo deixou de ser pensado por eles, e pela fatídica «filosofia analítica», que tantos estragos causou à tão famigerada cultura ocidental.

A verdade, porém, é que o mundo não precisa de filosofia, nem de filósofos para nada. A filosofia é que precisa do baloiço do mundo para poder existir. Para poder existir melhor a filosofia precisa é de entrar dentro da cabeça criativa de um qualquer jogador de corridas virtuais, desses que vivem agarrados à obsessão do poder interactivo das imagens. Das imagens com que se podem simular os contornos violentos do corpo em cima da partitura visual de um qualquer ecrã. O ecrã, «essa forma iluminada de resgate», que nos pode ajudar a dar saltos mortais em direcção aos inquietantes abismos do mundo (essa máquina misteriosa que sempre nos ajudou a pensar melhor). Mas, pensar melhor, não é nada mais nada menos, do que aprender a fugir sem qualquer tipo de filosofia. O que significa que é preciso aprender a matar todas as velhas teorias (inventar novas teorias de bolso), já que as velhas teorias podem matar o pensamento. Podem matá-lo porque este parece continuar demasiado ligado a uma espécie de «masturbação de grilos impotentes», diz-nos Eduardo Prado Coelho, em Tudo o que não escreveu (tudo o que não escreveu sobre o equilíbrio instável do mundo).

Mas, pensar e escrever é isso mesmo. É “procurar novas armas” (é agir) com as quais nos possamos defender dos perigos das inúmeras tempestades da vida. Porque a verdade é que nunca estamos demasiado preparados para nada, muito menos para pensar, e muito menos ainda para sentir . Para sentir o prazer de desenhar um circulo com a ponta dos dedos dos pés enterrados na areia molhada do mar. Tal como uma criança a sentir o prazer de moldar a plasticina com as mãos. As mãos enfiadas no barro até este ganhar a forma de uma pequenina parte da grande escultura do mundo. Esta é a magia de aprender a pensar a partir da enorme fragilidade das mãos. Das mãos e dos pés (eis o contributo da verdadeira fisiologia do corpo em movimento ou do movimento do corpo).

De facto, é tão bom poder pensar a partir da metáfora das mãos, dizia Deleuze (e dos pés, e da boca, e dos lábios, e da pele, e da carne), tal como uma criança a sentir o prazer de experimentar o barro a deslizar por entre os dedos acabados de limpar. Tal como Álvaro de Campos a experimentar o sabor do chocolate das palavras com que escrevia ao dizer; «Come chocolates, pequena! Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates». Agora começo a perceber, só os gulosos é que sabem viver. Só eles é que sabem viver bem longe das inúmeras tempestades de areia que continuam a existir no deserto do crânio daqueles que nunca aprenderam a pensar com as mãos, os dedos, a boca, a pele, o corpo...a fisiologia da carne! No fundo, no fundo,  não há programas que nos salvem...!

ARTES EM PARTES NET-ART-ACTIVISMO    3 PARTES DA ARTE
EM 3 ARTES EM PARTES....LAB. 2009/10 (Porto/Barcelona).